Geralmente é o que se deseja intimamente: paz para o mundo, paz para todos, paz para os torcedores, paz para os moribundos, paz para os iranianos. É um desejo legítimo, mas qual a nossa contribuição prática para ajudar a construir uma serenidade universal? O máximo que podemos fazer é garantir nossa própria paz. Portanto, esses são meus votos: deixe-se em paz.
Parece uma frase grosseira, mas é apenas um desejo sincero e generoso. Deixe-se em paz. Não se cobre por não ter realizado tudo o que pretendia, não se culpe por ter falhado em alguns momentos, não se torture por ter sido contraditório, não se puna por não ter sido perfeito. Você fez o melhor que podia.
Aproveite para estabelecer metas mas prosaicas para o futuro que virá, ou até meta nenhuma. Que mania a gente tem de fazer listinha de resoluções, prometer mundos e fundos como se uma simples virada de ano botasse para nos transformar numa pessoa mais completa e competente. Você será o que sempre foi -e isso já é muito bom, pois presumo que você não seja nenhum contraventor, apenas não consegue dar conta de todos os seus bons propósitos, quem consegue? Às vezes não dá. Vá no seu ritmo, siga sendo quem é, não espere entrar numa cabine e sair de lá vestido de super-homem ou de super-mulher. Deixe de fantasias. Deixe-se em paz.
Se quer tomar alguma resolução, resolva ajudar os outros, fazer o bem, dedicar-se à coletividade, seja mais solidário. Não deixe os menos favorecidos na paz do abandono, na paz do esquecimento. Mas esquecer um pouco de você mesmo, pode. Deve. Não se enquadre em comportamentos que não lhe caracterizam, não se enjaule por causa de decisões das quais já se arrependeu, não se arrebente por causa de questionamentos incessantes. Liberte-se desses pensamentos todos, dessa busca sofrida por adequação e ao mesmo tempo por liberdade. Nossa, ser uma pessoa adequada e livre ao mesmo tempo é uma senhora ambição. Demanda a energia de uma usina. Será mesmo tão necessário pensar nisso agora? Deixe-se em paz.
Não dê tanta importância à melhor roupa para vestir, à melhor frase para o primeiro encontro, às calorias que deve queimar, à melhor resposta para quem lhe ofendeu, às perguntas que precisa fazer para se auto-conhecer. Deixe-se em paz.
Texto: Martha Medeiros.
No fundo, este texto é uma forma como vejo o mundo, por isso postei. É meio meu. Não me deixo em paz. Estou sempre avaliando se agi certo ou errado, cultivo minhas dúvidas com adubo e custo a me perdoar. Só preciso de alguém que me ensine como faz isso, como se deixe em paz.
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